Slam Poetry: a popularização da poesia no século 21
No meio da praça central, no misto de barulho incessante do trânsito, vozes se confundem e se misturam, um grito se manifesta alto e claro. Da boca, palavras que soam por vezes bonitas, outras provocativas, muitas que cutucam e algumas que machucam. É a poesia em sua mais bela natureza. Desta vez, feita por diversas pessoas que também se misturam e se diferem: cada um querendo ser ouvido. Este é o movimento conhecido como Slam Poetry, em português “Batida Poética” ou poesia falada.
Em Joinville, a competição teve início em janeiro deste ano, e ocorre todo último domingo do mês, na Praça Nereu Ramos, trecho movimento da Rua do Príncipe. Lá, os poetas contemporâneos, em sua maioria jovens, se reúnem para falar em voz alta poesias em uma competição ainda pouco conhecida no Brasil. As regras são simples: cada participante, chamado de slammer, tem até três minutos para recitar sua poesia e o público é o jurado. Os prêmios, além da participação, são oferecidos pelos parceiros do Slam Joinville.
Filmagem: Lucas Pacifico
A poesia falada do movimento evidencia a importância de dar principalmente para aqueles que não conseguem ser ouvidos de outras formas. Nos trechos escritos pelos jovens, a poesia confronta e debate temas importantes da atualidade. A estudante História, Mariana Passos primeira ganhadora do Slam na cidade, utiliza em seus versos, palavras que lhe permitem expressão. Segundo ela, levantar a discussão sobre feminismo, gênero, autorismo e opressão, “são coisas para serem gritadas, provocadas e chorada, tudo ao mesmo tempo mas com amor e paixão”.
Sonhar alto e realizar…
Por mais que o Slam fuja dos clichês da poesia, podemos dizer que aqui em Joinville seu início tem relação com o amor. Na segunda edição do Slam Tiago Schult, 20 anos, criador do Slam Joinville fala sobre sua segunda tentativa em trazer o evento para a cidade, e deixa claro que sem os incentivos de sua noiva, Maria Eduarda, isso não teria se tornado possível. O pedido de casamento aconteceu na terceira edição, em cima do palco e rodeado pelos poetas e plateia que o casal conquistou. Ali, Tiago e Madu deram início a uma nova fase de suas vidas.
Segundo Maria Eduarda, Joinville tinha uma necessidade de um movimento que desse voz às pessoas, e é por isso que o casal resolveu trazer o Slam para a cidade. Para Tiago é importante que as pessoas tenham um espaço para se expressarem e serem ouvidas, pois aquilo gera uma troca de ideias. Ele também fala sobre sua vontade de levar alguém de Joinville para a Copa Slam. “O ganhador final é considerado o melhor poeta do mundo em forma critica ou construtiva”, explica.
Por todo o canto…
O Slam chegou no Brasil em 2008, em São Paulo, mas teve seu início em Chicago, nos Estados Unidos por volta da década de 80. O pioneiro no movimento foi Marc Smith, que escrevia poesias desde os 19 anos. Ele acreditava que a poesia era parte do ser humano e que deveria refletir no seu dia a dia, pois não era algo só para elite. Desse modo o Slam se espalhou em diversos países do mundo, tendo um público maior na Europa. A principal batalha de poesia, que é um campeonato internacional, acontece em Paris, na França. Há também um Campeonato Brasileiro de Slam, que ocorre na capital de São Paulo, onde o ganhador além de ganhar livros representa o país internacionalmente.
Todas Formas
Outra vertente do Slam é um que exala o poder feminino em seus versos: o Slam das Minas. Formado em 2015, em Brasília, e espalhado em 2016 para São Paulo, o movimento veio como um rompimento da voz sobreposta do homem, atingindo os timbres e pontos que somente elas para elas podem se encontrar. As competidoras contribuem para a divulgação de diversas pautas feministas por meio dos desabafos poéticos. As lutas representadas por elas discutem assuntos polêmicos na mídia e em sociedade, como aborto, patriarcado, vertentes, gênero e muito além do que se pode imaginar. No gráfico do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (abaixo), confira quais as palavras mais utilizadas nas poesias faladas das mulheres poetas do Slam.
“Uma sociedade sem arte é uma sociedade morta”
Em fevereiro, Alan Cordeiro, de 20 anos, entrou no movimento e espalhou suas palavras em pleno centro da cidade. Naquele domingo tão comum, com seu clima pacato e sua melancolia implícita, ele sentiu na pele a experiência de compartilhar em voz alta seu pensamento antes escrito somente em papéis para um público de carne, osso e opiniões. Estudante e autodidata, a melodia ritmiza parte da vida de Cordeiro, que trabalha em um projeto musical – tudo, desde instrumental à voz, realizado por conta própria em casa. Para ele, a importância do Slam vai além de somente uma competição de rima. “O Slam está me ajudando principalmente no feedback das minhas letras. Antes de eu cantar elas, eu as apresento pra ver a reação do público”, aponta o escritor.
“Aprendi que quem falar primeiro tem toda razão, quem ensina não é só a escola, cresci querendo ser um jogador, um jogador de letras e não um jogador de bola, quando um louco fala, todos ignora, como bots programados só para inverter a história, e para dispensar tudo que os apavora… nunca tiveram a chance de aprender que o que vale mesmo é o que tem dentro de você e não só o que tem fora, é foda que agora todos vão lembrar, da famosa frase que sempre vai ficar, aquela frase lá que fala que um livro pela capa nunca é bom julgar. Cada um é cada um eu sei mas onde vai acabar? Dividir o mundo pela cor da pele não não dá, qual é? E ainda riem achando que tem graça, mas pra eles cor de pele é o que difere a raça. Hmmmmm. É só olhar no espelho mano, hoje te trago a notícia talvez pra você seja a maior news do ano única e pior raça que existe é o ser humano!” – Alan Cordeiro
A história de Alan com a poesia é hereditária. Bisavô poeta, os versos seguiram as gerações e mesmo com mais de cem anos de separação entre os dois, eles permanecem unidos pelas palavras. As semelhanças que permanecem entre os anos, vão além da “paixão pela poesia”, como Cordeiro descreve… é a necessidade da arte na vida, principalmente em sociedade. “Uma sociedade sem arte é uma sociedade morta”, reflete o jovem escritor.
Conteúdo produzido para o Primeira Pauta Digital. | Disciplina Jornalismo Digital II, 5ª fase/2019
Reportagem: Amanda Cristina. Bruna Schenekemberg e Rafaela França