Meme: recurso que une piada e informação
Recurso amplamente utilizado nas redes sociais é alvo de estudos e ainda serve de conteúdo para jornais
Se tem um fenômeno presente na vida da maioria dos brasileiros, é a internet. Junto dela estão as redes sociais, que são abastecidas com memes . É só abrir o feed do Facebook, Twitter e até mesmo o Instagram que esse tipo de conteúdo surge nas telas dos computadores e celulares. Mas você sabe o que é um meme?
Segundo o artigo “Consumo de Memes: Imagens Técnicas, Criatividade e Viralização“, da doutoranda Alessandra Maia e mestranda Pollyana Escalante, de Tecnologias da Comunicação e Cultura da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, um meme hoje pode ser definido como:
1 – Propagação, repetição, imitação, mutação, performance e viralização.
Mas o termo não é tão recente quanto parece…
2 – Em 1976, Richard Dawkins lança o seu livro “The Selfish Gene”, onde desenvolve a sua teoria sobre os memes.
3 – Dawkins é um biólogo britânico que define um meme como parte da memória, uma espécie de fragmentos culturais capaz de se replicar rapidamente.
4 – Segundo ele, o sucesso e viralização de um meme depende de sua adaptação ao ambiente sociocultural no qual ele surge ou se propaga.
Um meme normalmente é composto por:
5 – Fotos ou prints de: celebridades, pessoas anônimas, personagens de animação, entre outros. Alguns vêm acompanhados de texto, que dão um tom cômico à imagem.
Na era digital, os memes não estão restritos a peças isoladas e sim ao contexto coletivo no qual as mensagens são criadas e recriadas. De acordo com o jornalista e mestre em jornalismo Ricardo Sékula, o entendimento dos memes depende da quantidade de informações do público sobre o tema e o quanto ele consegue “ler” os símbolos da mensagem.
Sékula é de Recife e estudou os memes como um exercício de contrapoder a discursos político-midiáticos nas eleições presidenciais de 2014. Para ele, o ponto central desse tipo de conteúdo está ligado às novas possibilidades de produção, manipulação e compartilhamento das informações, onde o público assume um papel cada vez maior no processo comunicacional.
Quando o assunto é política, Sékula lembra que a piada e o riso sempre fizeram parte da cena política como um todo. “Antes estava apenas em pequenas rodas de conversa ou eram expressas por especialistas em veículos específicos de comunicação. Com a internet a piada política ganhou uma dimensão midiática muito maior.”
Não só quando o assunto é política, mas também quando se tratam de estudos, os memes viralizam e ganham a atenção dos adolescentes e adultos, principalmente no meio acadêmico.
“Não vivo sem”. É assim que acadêmica de Arquitetura e Urbanismo Istéfani Oliveira explica a sua relação com este universo. Para ela, é a melhor invenção para descontrair as tensões diárias.
Eles já se tornaram parte da vida cotidiana de milhares de pessoas e a popularidade dos memes no Facebook entre os jovens é inevitável. Ao entrar nas redes sociais é comum encontrar compartilhamentos e comentários em posts demonstrando uma ironia sobre a vida universitária. “Eu adoro as do ‘morre diabo’ e as da Gretchen, porque são engraçados”, conta Istéfani.
A rainha dos GIFS já ganhou espaço na bolha acadêmica. Prova disso é que um professor de português resolveu atrair a atenção dos alunos de forma diferente: inserir memes nas provas dos estudantes. O caso aconteceu em Belo Horizonte (MG). Em entrevista ao portal G1, o professor Vitor Lucas explicou que os memes variam de acordo com a nota. Caso a nota fosse boa, Gretchen estava feliz, se a nota fosse baixa, a cantora estava triste. No caso de notas médias, Gretchen também aparece, só que com uma postura mais séria.
Além de entreter, os memes se tornaram uma quebra de tabu. Na visão do também estudante de Arquitetura e Urbanismo Cecil Prach da Silva, as imagens do Papa Francisco são um exemplo. “Ele é representante de uma organização tão séria e mesmo assim parece ser descontraído e engraçado”, diz. O jovem ainda acrescenta que este conteúdo é arte da geração atual. “Como toda arte representa o seu povo e o seu modo de pensar, os memes deixam em evidência a nossa dependência da tecnologia.”
Jaraguá informa e usa memes
Informação e humor podem sim ser uma boa combinação. O Por Acaso é um exemplo disso. Criado em 2003 pelo publicitário Ricardo Daniel Treis e pelo mercadólogo Max Pires, o veículo é direcionado apenas às informações de Jaraguá do Sul, cidade que fica no norte de Santa Catarina.
A equipe, formada por dois jornalistas, dois estagiários, uma social media e um videomaker, além dos dois fundadores, que comandam o editorial e a parte comercial, alimenta também as redes sociais e é claro, onde surgem os memes.
De acordo com Misael Felipe Freitas, jornalista do Por Acaso, por produzirem conteúdo focado em cultura e entretenimento, o uso de memes é praticamente inevitável. “Nas nossas redes sociais, pensamos o uso de memes de maneira mais estratégica. Temos a intenção de aumentar o engajamento com o nosso público.” O jornalista relata que não usam qualquer meme que surge na internet, mas selecionam aqueles que conversam com a “personalidade” do site.
Não é apenas no site e na página do Facebook que a equipe dosa o bom humor com memes. O Por Acaso também está no Instagram, YouTube e Twitter, cada canal com um direcionamento diferente.
Misael afirma que esse fenômeno da internet é importante na comunicação por aproximar o consumidor ao veículo, além de ajudar a personalizar o conteúdo publicado. “Os seguidores interagem por meio dos comentários e também mandam informações e sugestões com memes, além de compartilhar os que produzimos”, exemplifica.
Dose certa de humor
Apesar de ser uma alternativa de tornar o consumo de informação mais atrativo, é preciso estar atento quanto ao teor da brincadeira. O jornalista Misael Felipe confirma que, como tudo que se publica na internet, ninguém está livre de não gostar da piada. “Sempre usamos memes com equilíbrio, mas, para os casos em que alguém não gosta da piada, levamos na boa e tentamos responder a pessoa de forma que ela veja que aquilo é um humor leve e despretensioso”, conta.
Para a produção de conteúdo, a equipe está sempre atenta ao que fica nos “Trends”, ou seja, nos assuntos mais comentados no Twitter, e relacionam com o factual de Jaraguá. “Temos o cuidado de não usar muito no começo porque a maioria das pessoas não conhece ainda”, justifica.
Projeto experimental com memes não é brincadeira!
Já pensou em concluir parte do seu curso com uma pesquisa sobre memes? Pois é, Fernando Aquino da Costa ousou na hora de pensar em um tema para o seu projeto experimental. O egresso da Faculdade Ielusc decidiu pesquisar sobre memes porque sairia dos moldes do jornalismo do meio acadêmico.
Também seria um desafio, já que o egresso não é muito ligado às redes sociais e nem tinha o costume de acompanhar o que está acontecendo na internet. “Querendo ou não, os memes são um meio muito valioso de comunicação. Não é incomum hoje em dia ver grandes empresas utilizando os memes para se aproximar de seus públicos-alvo, por exemplo.” Fernando questiona o porquê não apropriar-se de uma linguagem atual, comum e que atinge milhares de pessoas todos os dias para informar.
A ideia do projeto era utilizar memes que estavam circulando nas redes sociais – especificamente o Facebook e o Twitter – para escrever matérias jornalísticas sobre a origem e o contexto deles.
O jornalista explica que a maioria das pessoas associa os memes ao humor, mas, apesar de ser usado com mais frequência atualmente, os estudos sobre o recurso são antigos. “Existem desde os anos 70 – e é importante que nós, como comunicadores e jornalistas, estejamos a par de como a comunicação se altera com o passar dos tempos”, ressalta.
Segundo ele, grande parte dos internautas considera os memes algo supérfluo, mas que na verdade o recurso é uma forma de determinados grupos se unirem e terem voz nas redes. “Memes são tão poderosos como ato comunicacional que podem até ter impacto político, como a hashtag #BelaRecatadaedoLar, por exemplo. Começou como uma brincadeira, mas em poucas horas virou uma crítica enorme à imprensa machista que temos no país”, relembra.
Fernando confirma que os memes não são apenas uma tendência, mas que fazem parte da nossa realidade e que podem ser usados também como estratégia de vendas. “As grandes empresas sabem que falar a língua da população é a forma mais fácil de atrair consumidores. O fato é que os memes existem, mas faltam iniciativas que usam memes como forma de informar pessoas”, aponta.
O jornalista destaca que por meio do seu projeto conseguiu extrair um formato diferente para fazer jornalismo. “As matérias que escrevi para o InfoMeme estavam cheias de gírias, erros gramaticais propositais e palavrões, o que foge completamente da ‘etiqueta’ do jornalismo tradicional. Mesmo assim, isso não impediu a matéria de informar pessoas”, conclui.
Existe receita para criar um meme viral?
Nikki Vargas, fundadora da página Ajudar o povo de humanas a fazer miçanga, que já acumula mais de 5 milhões de curtidas no Facebook, conta que um meme geralmente é criado como uma ironia de algo cotidiano, algo que a pessoa viveu, ou até algo que esteja preso e precise ser dito de alguma forma.
A criadora considera os memes uma forma de expressão. Ela afirma que não existe uma receita para criar um viral: “Eu já fiz memes que achei que seriam ótimos mas ninguém curtiu, outros que milhões curtiram, é algo muito incerto.”
E quando acontece de um meme fazer muito sucesso, surge um outro problema muito comum na web: o plágio. Por enxergar os memes como forma de expressão, Nikki ressalta a importância da originalidade. “O meme é da pessoa, é a vivência dela. Muitas vezes eu já fui copiada e me senti ofendida porque é algo meu, eu vivi aquilo”, conta.
Além de forma de expressão, os memes também são um meio de transmitir informações, que podem ser verdadeiras, ou não. Sobre isso, Nikki diz que existem os conteúdos irônicos que não podem ser levados a sério, mas também há aqueles que as pessoas fazem pra ofender, criar fake news, e até mesmo maldizer as outras. “Assim como o meme tem o dom de ser uma porta de comunicação, também pode ser de destruição”, reflete.
Reportagem: Annabel Machado, Diego Mahs, Helena Bosse, Leonardo Koch, Liandra Tank, Mariana Costa e Milena Costa.
Conteúdo produzido para o Primeira Pauta Digital | Disciplina Jornalismo Digital II
5º Fase | 2018